ECONOMIA | 09.09.2025
“One Big Beautiful Bill”: o que é e como pode afetar a economia dos EUA
No dia 04 de julho, o Congresso dos Estados Unidos aprovou a lei fiscal “One Big Beautiful Bill Act” (OBBBA), uma iniciativa promovida pelo presidente Donald Trump. Esta norma reverte a abordagem da “Inflation Reduction Act” (IRA) do presidente anterior, Joe Biden, ao eliminar incentivos verdes e priorizando a reindustrialização, a produção de energia tradicional e a soberania fiscal. Em geral, inclui cortes fiscais permanentes, subsídios para a indústria pesada, mais investimento no gasto em defesa e medidas migratórias mais rígidas.
A MAPFRE Economics, o Serviço de Estudos da MAPFRE, menciona em seu relatório Panorama econômico e setorial 2025: perspectivas para o segundo semestre que vários analistas já alertaram para desequilíbrios fiscais de longo prazo como consequência de uma possível dissociação entre a dimensão dos cortes de impostos e os ajustes no gasto público.
Conteúdo geral da OBBBA
No cenário tributário, o componente central da OBBBA é a expansão de grande parte das provisões da “Tax Cuts and Jobs Act” (TCJA) de 2017, que inclui a manutenção dos cortes no imposto de renda de pessoas físicas, a ampliação da dedução padrão e um limite maior para a isenção do imposto sobre herança a partir de 2026. Paralelamente, são ampliados os créditos fiscais por filhos e cria novas deduções fiscais sobre gorjetas, horas extras, juros de empréstimos para automóveis e para pessoas acima de 65 anos sobre sua renda tributável. Assim mesmo, a medida aumenta temporariamente o limite de dedução por impostos estaduais e locais (State and Local Tax, SALT).
Quanto aos incentivos ao investimento, estabelece-se a dedução imediata e permanente de investimentos em ativos de curta duração e em P&D. Esta medida é vista como um dos elementos com maior efeito estrutural positivo sobre o crescimento. Também são promovidos benefícios fiscais a setores estratégicos, como o carvão metalúrgico (classificado como “mineral crítico”), para incentivar sua produção e retarda por dez anos a aplicação de uma taxa sobre as emissões de metano. Nessa mesma linha, os créditos tributários da IRA para projetos de energias renováveis serão gradualmente eliminados.
No que se refere ao gasto, a OBBBA prevê aumentos em defesa e controle migratório. Já os gastos em programas sociais, como o Medicaid e o Supplemental Nutrition Assistance Program (SNAP), serão reduzidos, mas esta medida apenas será implementada em 2027, após as eleições de meio mandato. Por fim, aumenta o teto da dívida em 5 trilhões de dólares, fixando-o em 41,1 trilhões de dólares e evitando uma próxima negociação orçamentária pelo menos até 2027.
Consequências fiscais e na dívida
O Escritório de Orçamento do Congresso (CBO) calcula que a OBBBA representará aproximadamente 3,8 bilhões de dólares adicionais ao déficit federal nos próximos dez anos, valor que pode chegar a 4,5 bilhões se os juros associados à dívida forem incluídos. Nesse sentido, espera-se o crescimento de até 118% do PIB do volume de dívida em mãos privadas até 2034.
Este aumento do déficit e da dívida é explicado pela extensão das provisões fiscais da TCJA e pelas novas deduções introduzidas. Por outro lado, os cortes no gasto apenas entrarão em vigor de forma diferida a partir de 2027, refletindo a estratégia política que visa estimular imediatamente e adiar a consolidação fiscal diante das eleições intermediárias, apesar de um maior risco de desequilíbrio estrutural no médio prazo.
A MAPFRE Economics ainda aponta que existe o risco de que as medidas temporárias da OBBBA (como as deduções ampliadas) sejam renovadas em futuros períodos eleitorais, favorecendo ainda mais o deterioro fiscal. Nos mercados financeiros, a OBBBA aumentou as expectativas de emissão líquida de dívida e incrementou os rendimentos dos títulos do Tesouro. Nesse sentido, a carga de juros, já superior ao gasto em defesa, “põe em dúvida a sustentabilidade do endividamento”, enquanto as medidas para limitar a exposição dos bancos comerciais à dívida pública (situada em cerca de 20% do total de ativos) foram limitadas, e “continua o risco de que investidores estrangeiros diversifiquem fora do dólar”, apesar da eliminação de sanções fiscais.
Além dos impactos imediatos causados pelo impulso fiscal de curto prazo, o crescimento dos juros associados à dívida pública aponta “uma dinâmica preocupante” para a MAPFRE Economics. “Alguns analistas consideram que se trata de um ponto de inflexão estrutural, onde o alto nível de dívida e o aumento contínuo das taxas reais de juros podem levar a uma crise de confiança, caso não sejam adotadas as medidas corretivas necessárias para equilibrar a relação entre dívida e déficit fiscal”, defendem.
A OBBBA representa uma importante vitória legislativa na agenda da administração Trump, que consolida várias promessas eleitorais em matéria de redução fiscal e reindustrialização. No entanto, o Serviço de Estudos da MAPFRE argumenta que “o custo fiscal é significativo e seu desenho compromete, em grande parte, a sustentabilidade orçamentária futura”.
“Em um cenário de taxas de juros reais em aumento, maior custo da dívida e fragmentação geopolítica, a credibilidade fiscal dos Estados Unidos poderia ser abalada”, insiste. Consequentemente, o país pode estar se aproximando do ponto crítico no ciclo da dívida, em que os custos do serviço superam as margens de manobra do orçamento. Embora uma crise fiscal não seja inevitável, evitá-la exige um aumento de receitas e uma racionalização dos gastos públicos que, por enquanto, não parece estar nos planos da atual administração.
ARTIGOS RELACIONADOS: